segunda-feira, 2 de julho de 2007

Suspiros

Memórias momentâneas que estragam a alma. Uma noite ao longe, com as luzes da cidade interpretando o ser o que não ser. As nuvens que espalham um segredo no luar que não se vê. Silêncio. Ofusca o querer, esconde o trépido aperto de seguir. A solidão de mil pessoas e um só corpo. Nuvens negras acinzentadas que denotam uma expressão de horror abandonado no mar escondido no céu sinistramente absorvido pelas luzes. Dói-lhe o ombro, não pesa, não sente nada, mas dói. Está só. Hoje afigura-se uma menor quantidade de pontos amarelos atravessados nos prédios e avenidas. Ninguém está ali, parece-lhe.
Já não lhe apetece mais mostrar o que a atormenta. Deseja apenas gritar ao mundo o que não detém, ou o que não a preenche, há alguns anos. Mas está farta. Segue o seu trilho, com resignação. Mas uma conformidade tão irritante que a suga nas noites sóbrias e solitárias. Na cadeira balança consoante o vento lhe diz soprando ao ouvido o que quer ouvir. É uma criança, uma menina, as suas tranças não querem traçar o futuro, nem lhe querem contar o segredo. Aquele.
Apetece-lhe chorar enfurecida, largar lágrimas pela atmosfera apertada, desapertar-se da calma tranquilizante que as formigas lhe querem dar. Não. Não consegue mais. Não quer. Mas sente que nada pode fazer… E quer.
O ombro pesa-lhe cada vez mais.
Quer paz, a paz dela. No baloiço começa a andar com uma força que a prende e a fixa numa raiva amargurante. Quer saltar para a árvore mais alta e voar. Quer desaparecer na noite. Com as luzes semi-acesas, sem ninguém dar conta (e mesmo que dessem).
Quer causar a sua felicidade nos seus momentos instantâneos. Quer acreditar que ainda é possível, e que ainda merece. Ninguém a vê, ninguém a conhece, e todos a julgam sem se olharem. Ela erra, porque ninguém o faz (...), mas quer encontrar algo, não a deixam. Ela própria não se deixa. Porque não quer o mesmo, quer revelar a magia, voar na imaginação, sonhar com encontros. Acreditar em contos de fadas… É uma Bela que quer o seu Monstro… Mas os monstros não existem. É pena.
A noite abraça o mais estúpido dos pensamentos, dos sentimentos. Isto tudo é tão estupidamente sincero mas grotesco. Está cansada e dói-lhe o ombro. Vai dormir para o terraço e cobrir-se com as estrelas que nem sequer estão lá.
Irrito-me.

2 comentários:

inocência perdida disse...

"Ninguém a vê, ninguém a conhece, e todos a julgam sem se olharem."
Semeaste o texto de frases avassaladores...de vida amada, sofrida e chorada, como tem que ser vivida, como é difícil viver!
Não sou ninguém para o dizer mas o texto está delicioso e a escrita poderosa, como quem escreve de forma sofrega para que nada seja esquecido e nada fique por dizer...
Parafraseando o teu título...sem palavras...

Continua a escrever assim...muito boa gente iria aprender alguma coisa "se te lesse"!

Agradavelmente surpreendida**

Clara Mafalda disse...

que texto lindo madrinha :)
com estas palavras é impossivel ficar irritada e desassossegar o coração que adormece debaixo das estrelas.
beijo gd